domingo, 19 de dezembro de 2010

Governo Lula

Interpretando os números

O Presidente Lula chega ao final de oito anos de governo com inéditos e consagradores 83% de aprovação. Muitas podem ser as razões elencadas para explicar o fenômeno. Lula é um personagem-símbolo da história recente do país. Emergiu das lutas sindicais e do movimento pela redemocratização. Fundou o PT e a CUT. Disputou quatro eleições presidenciais até alcançar a vitória. Revelou-se um líder carismático, um notável negociador e um hábil estrategista. Construiu uma profunda identidade com os segmentos sociais historicamente excluídos. Indubitavelmente, será sempre lembrado na história brasileira.

Para além de todos esses atributos, vou repetir argumentos publicados em artigos anteriores: está na economia a principal explicação para a popularidade de Lula. Seu governo termina com o menor índice de desemprego (5,7%) desde que foram iniciadas tais medições pelo IBGE. Sob Lula, a economia brasileira voltou a crescer, houve redução da pobreza e crescimento da classe média. A estratégia foi distribuir renda, facilitar o crédito, elevar a capacidade de consumo, ampliar o mercado interno e com isso sustentar a expansão da produção e a criação de novos empregos.

Os ricos ganharam. Os banqueiros continuaram financiando o déficit público em troca da mais elevada taxa de juros do mercado financeiro internacional. Os investidores externos continuaram trazendo suas empresas para o país em troca de acesso a um dos maiores mercados de consumo em expansão. Os empreiteiros continuaram ampliando suas operações com as obras do PAC. O BNDES elevou a oferta de crédito a juros subsidiados para facilitar a fusão de empresas brasileiras, transformando-as em líderes mundiais nos seus respectivos segmentos de mercado.

Os pobres também ganharam. "Bolsa-família", "Minha casa, minha vida", "Luz para todos", "PRONAF", "Programa de Aquisição de Alimentos - PAA", "Territórios da Cidadania", são exemplos de políticas públicas com forte repercussão social, além da elevação do valor do salário-mínimo acima da inflação e da expansão da cobertura da previdência social, que tiveram significativo impacto na elevação da renda e das condições de consumo dos grupos sociais historicamente excluídos.

Para sustentar esse modelo, chegaremos também à maior carga tributária da história: 37% do PIB se alcançarmos o crescimento esperado de 7,5%. Houve expansão das despesas correntes, redução da poupança interna e manutenção dos investimentos nos mesmos patamares dos governos anteriores, quando a economia não cresceu. Isso significa que temos um crescimento baseado na sustentação de uma bolha de consumo, alimentada por crédito barato e endividamento das famílias.

Enquanto todos compram celulares, TVs de tela plana, carros, motos, imóveis etc., a saúde e a educação entram em colapso. Nosso desempenho nos mais recente PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), que comparou 65 países, foi de 53° lugar em leitura e 57° lugar em matemática. A falta de educação afeta também os níveis de cultura e participação política. No último ranking mundial sobre democracia da revista "The Economist", o Brasil caiu do 41° para o 47° lugar.

O governo Lula melhorou a distribuição de renda, mas não conseguiu reduzir as desigualdades regionais. Segundo o IPEA, nos últimos 13 anos quase não houve nenhuma alteração na distribuição regional das riquezas. Enquanto o PIB per cápita da região sudeste é 33% maior que a média nacional, o da região nordeste é 53% menor que a média nacional. Há uma enorme concentração espacial da riqueza. Segundo o IBGE, seis capitais, com apenas 13,5% da população do país, concentram 25% do PIB.

Aparentemente, suceder um governo que termina com 83% de aprovação é um enorme desafio. Dilma Rousseff terá que enfrentá-lo. Mas é possível antever um caminho. Certamente, é preciso manter o crescimento, os empregos, a renda, o consumo. Todavia, também é possível fazê-lo melhorando os serviços de saúde e educação; criando oportunidades de trabalho em empreendimentos ambientalmente sustentáveis como a ampliação da energia eólica, solar e de biomassa na nossa matriz energética; substituindo a prioridade para o transporte individual pelo transporte público de qualidade; fortalecendo políticas públicas de desenvolvimento local que promovam a desconcentração do conhecimento, da riqueza e do poder político.

Tenho esperança de que uma mulher consiga compreender o desenvolvimento de uma outra maneira, que possa ir além do conceito tradicional, obsoleto e insustentável, baseado na idéia do crescimento e do progresso material ilimitado.

Juarez de Paula

Um comentário:

  1. Excelente artigo Juarez. Claro e preciso. Aguardo com esperança as diretrizes reais do Governo Dilma. Um abraço,
    Darly Farias - Fortaleza(CE)

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