sexta-feira, 4 de setembro de 2009

O detalhe que falta

O presidente Lula tem aproveitado o debate sobre a regulação do processo de exploração das reservas de petróleo do pré-sal para discutir a destinação dos resultados desta riqueza mineral recem-descoberta. Tem proposto que a riqueza não fique concentrada apenas nos estados "produtores" de petróleo (na verdade foi a decomposição natural de matéria orgânica que o produziu), mas que seja distribuída para todas as unidades da Federação. Além disso, tem proposto que parte desta riqueza seja dirigida para um fundo social, destinado a investimentos em educação, preservação ambiental e combate à pobreza. Também tem defendido restrições à exportação de petróleo, de modo que o país desenvolva ainda mais sua indústria petroquímica, exportando derivados, com maior valor agregado, gerando empregos e oportunidades de negócios no mercado interno. Por fim, tem reforçado o monopólio da PETROBRAS na exploração das reservas, de modo que o país não perca o controle sobre os estoques.

Considero todas as preocupações essencialmente corretas. Porém, ficou faltando um detalhe. Todos sabemos que reservas de petróleo, por maiores que possam ser, são recursos finitos. Portanto, é preciso colocar a questão: e quando o petróleo acabar? Quanto da riqueza do petróleo do pré-sal será destinada ao desenvolvimento de tecnologias para aproveitamento de fontes energéticas sustentáveis e renováveis, tais como a energia eólica, a energia solar, a energia cinética das marés ou os biocombustíveis?

A era do petróleo está chegando ao fim. Não necessariamente porque os estoques de petróleo estejam em declínio, o que também é verdade. Mas principalmente porque o consumo de energia tem sido crescente, porque a maior parte dessa energia tem sido gerada a partir de combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão mineral) e isso tudo tem ampliado o efeito estufa, provocando mudanças climáticas imprevisíveis, incontroláveis e que ameaçam a manutenção da vida no planeta. Dentro em breve, as restrições ambientais ao uso de combustíveis fósseis será de tal ordem, que os estoques remanescentes de petróleo, gás natural e carvão mineral perderão valor. Alguém já disse que "a idade da pedra acabou não porque as pedras tenham acabado". O mesmo vale para os combustíveis fósseis.

A era do petróleo vai acabar na medida em que as tecnologias para aproveitamento de fontes energéticas sustentáveis e renováveis forem competitivas, em termos de custos, para a substituição dos combustíveis fósseis. Hoje, os custos de exploração das reservas de petróleo do pré-sal só são viáveis em razão do constante crescimento do preço do barril do petróleo, que é um reflexo da redução da oferta e do crescimento do consumo. Porém, na medida em que se ofereçam alternativas mais baratas, ou de igual custo, mas sem os passivos ambientais decorrentes do uso dos combustíveis fósseis, toda a indústria do petróleo ficará obsoleta.

O Brasil possui todas as condições naturais para ser uma potência no aproveitamento de fontes sustentáveis e renováveis de energia. Porém, precisa dar prioridade a essa tarefa e precisa investir seriamente em ciência e tecnologia aplicada para este fim. A riqueza do pré-sal deveria ser fortemente orientada nesta direção. Não interessa ser a última potência da era do petróleo. É melhor ser a primeira potência em tecnologia de aproveitamento de fontes sustentáveis e renováveis de energia. É assim que vamos ter "crescimento econômico com distribuição de renda", ao tempo em que abrimos caminho para um modelo de desenvolvimento sustentável.

Juarez de Paula

3 comentários:

  1. Corretíssimo, Ju.

    O meu consolo para a estupidez desenvolvimentista é que, muito provavelmente, a humanidade se extinguirá antes de destruir completamente o planeta. E este ainda será capaz de gerar novas espécies, esperemos mais inteligentes, antes do sol se apagar e tudo voltar ao silêncio e a escuridão...

    Como você pode ver, ando otimista (rs rs rs)...

    Abraços,

    Atila

    ResponderExcluir
  2. Ótimo artigo que nos leva a perceber que algumas "excelentes" notícias de possível crescimento econômico, na verdade, faz-nos esquecer da necessidade de repensar a forma errônea de uso dos recursos naturais. É hora de não mais mascarar a necessidade de uma mudança de mentalidade a caminho do desenvolvimento sustentável.

    Joana Bicalho

    ResponderExcluir
  3. Esse detalhe que falta é TUDO. Concordo plenamente e cheguei a questionar a Petrobrás, quando do lançamento da descoberta do pré-sal.
    Ela já está criando de forma experimental, um posto de abastecimento de energia renovável para motos. O que eu não entendo é por que os conhecimentos técnicos não são libertários? porque a gente não capta diretamente a energia renovável para os veículos e utilitários? Vamos ser eternamente dependentes de abastecimento, quando poderíamos direcionar o consumo de energias com autonomia para novas pesquisas no desenvolvimento sustentável.

    ResponderExcluir