terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Explicando o lulismo

O lulismo quer congelar o Brasil

O lulismo deseja que Lula volte à presidência em 2014. Para que isso se torne possível, é preciso “congelar” o cenário como ele está hoje, ou seja, com Lula aparecendo nas pesquisas com mais de 80% de aprovação e sem nenhum nome expressivo que represente alguma possibilidade de “novidade” política e administrativa.

Considerada essa premissa, muita coisa se esclarece na estratégia eleitoral do Governo.

Explica, em primeiro lugar, a imposição de Dilma como candidata, sem discussão interna no PT e sem diálogo com os demais partidos da base aliada. Dilma é uma excelente candidata para o lulismo, seja para ganhar, seja para perder. Não tem cacife eleitoral. Jamais disputou uma eleição. Não é conhecida. Não é carismática. Portanto, se perder, terá sido pelas suas próprias limitações. Todavia, se vencer, terá sido, obviamente, pela capacidade de transferência do prestígio pessoal de Lula para a sua candidata, o que só reforça o lulismo. Dilma não teria, em nenhuma hipótese, condições de pleitear sua reeleição, deixando o caminho livre para que o lulismo construa o retorno de Lula à presidência.

Explica, em segundo lugar, a escolha de Serra como adversário principal. Serra é o melhor opositor para o lulismo, seja para ganhar, seja para perder. Perdendo, permite que Dilma fique “esquentando a cadeira” até Lula retornar. Caso vença, não terá derrotado Lula, mas apenas Dilma, com todas as suas limitações. Seu governo não poderá deixar de manter as conquistas sociais legadas por Lula. Sem carisma pessoal, Serra não seria um candidato difícil de ser derrotado por Lula em 2014, sobretudo se seu governo não conseguir êxitos comparáveis aos do governo anterior.

Explica, em terceiro lugar, a estratégia da polarização. Dilma e Serra representam essencialmente o mesmo. São a continuidade de um programa desenvolvimentista, fortemente lastreado em grandes obras de infra-estrutura, no fortalecimento da competitividade das grandes empresas, na defesa dos interesses dos grandes bancos. Qualquer dos dois representa “mais do mesmo”, ou seja, nenhum dos dois representa “novidade” política que ameace o lulismo.

Explica, finalmente, porque é importante impedir o surgimento de outras candidaturas que possam alterar esse cenário. Aécio candidato pelo PSDB seria uma incógnita. Poderia ter uma larga margem de vantagem em MG, segundo maior colégio eleitoral do país. Poderia desestabilizar a “base aliada” do Governo, pois atrairia apoios de vários partidos, incluindo o PMDB do vice de Dilma e o PSB de Ciro. Poderia, caso vencesse, destruir a falsa polarização entre PT e PSDB inventada em São Paulo.

Ciro é outra ameaça ao lulismo. Polemista de grande desenvoltura, pode ultrapassar Dilma na corrida eleitoral, enfrentando Serra num eventual segundo turno. Caso vitorioso, inauguraria uma nova política de alianças e um novo programa de governo, jogando o lulismo num cenário de completa incerteza. Essa é a razão pela qual o Governo gasta toda a sua energia para afastá-lo da disputa presidencial.

Marina talvez seja a mais séria ameaça ao lulismo. Protagonista de uma história de superação muito similar à de Lula, representante legítima de uma temática de grande relevância no mundo contemporâneo – o desenvolvimento sustentável, portadora de enorme prestígio internacional, única candidatura capaz de empolgar a juventude e os movimentos sociais, Marina representa uma inquestionável “novidade” política capaz de alterar completamente o cenário. Essa é a razão pela qual se articula um poderoso movimento de bastidores para tentar “desidratar” sua campanha, de modo que não tenha acesso aos apoios e meios materiais que possam torná-la mais competitiva.

Estamos diante de novos e crescentes desafios. Há uma crise civilizatória em curso, resultado da convergência de várias crises: a crise financeira internacional, a crise energética do fim da era do petróleo barato, a crise climática decorrente do aquecimento global. O mundo não dispõe de instrumentos democráticos de gestão dessas crises, que repercutem em todos os países. O Brasil pode e precisa ocupar um lugar de liderança na afirmação de um novo modelo de desenvolvimento, includente e sustentável. Mas para isso, é preciso que não fiquemos congelados no tempo, é preciso dar um passo além do lulismo.

Juarez de Paula

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